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28 de out. de 2016

Salários congelados e menos concursos: como a PEC 241 pode afetar o funcionalismo público. E deputados e senadores estão incluídos nesse grupo?

'Se vai ter cortes nas escolas e nos hospitais, por que não nos benefícios de juízes?'
Essa é a pergunta que vem se multiplicando nas redes sociais desde que o governo Michel Temer apresentou a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 241, que pretende amenizar o rombo nas contas públicas. Na terça-feira, o texto foi aprovado em segundo turno pelo plenário da Câmara e agora segue para o Senado. Ele estabelece um teto para o crescimento das despesas públicas federais por 20 anos e tem recebido muitas críticas por alterar o financiamento em duas áreas essenciais para o bem-estar da população: saúde e educação.
Mas como a PEC afeta os funcionários do Legislativo, Judiciário e do Executivo? Deputados e senadores não estão incluídos nesse grupo.
Segundo especialistas consultados pela BBC Brasil, há três tipos de impacto. O primeiro deles está descrito na proposta: caso o limite de gastos seja descumprido por um dos três Poderes ou por um órgão, o mesmo não poderá conceder aumentos para seus funcionários nem realizar concursos públicos. Outras sanções são impedir a criação de bônus e mudanças nas carreiras que levem a aumento de despesas.
As medidas funcionam como uma forma de punição se a conta não fechar.
Há também consequências que não são citadas na PEC, mas podem vir após sua implementação, como o congelamento de salários e uma discussão maior sobre distorções do funcionalismo público do país. De acordo com os especialistas, existe a possibilidade de que, com a aprovação da proposta, os servidores federais deixem de ganhar reajuste e não tenham suas remunerações corrigidas pela inflação por vários anos - mesmo com o cumprimento do teto.
Isso acontece porque o limite é global e vale para todos os custos de um Poder ou de um órgão. Dessa forma, se o Executivo tiver que dar mais verba para as escolas, por exemplo, poderá segurar as remunerações de seus empregados. Na prática, isso equivaleria a reduzir os salários, porque a inflação - medida pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) - é a desvalorização do dinheiro, quanto ele perde de poder de compra em determinado período. Sem a correção, é como se o pagamento diminuísse, porque o mesmo valor compra menos do que antes.


O congelamento é sugerido por causa do grande peso que os salários têm no orçamento. Em 2015, 20% das despesas do governo federal foram com pessoal. Para efeito de comparação, as chamadas despesas correntes, que incluem os custeios com saúde, educação e ciência, corresponderam a 27% do mesmo total. O percentual ocupado pela folha de pagamento deve crescer mais com os aumentos concedidos neste ano. Em julho, o presidente Michel Temer sancionou uma lei que concedeu reajuste de até 41,47% nos salários dos servidores do Judiciário e aumento de 12% para analistas e técnicos do Ministério Público da União. No entanto, o que mais prejudica as contas públicas é a Previdência desse grupo de mais de 2 milhões de pessoas, das quais 44% são aposentados ou pensionistas. Um levantamento realizado pelo professor Nelson Marconi mostrou que empregados da área pública ganham mais do que os da iniciativa privada em todos os níveis de escolaridade. Entre os que têm ensino médio, por exemplo, essa lacuna era, em média, de 44% no ano passado.
Gil Castello Branco, da Contas Abertas, cita os salários altíssimos de algumas carreiras e o sonho dos jovens de entrar em órgãos públicos apenas pela estabilidade como distorções produzidas pelo atual sistema. "Já houve matérias mostrando garçom do Senado ganhando R$ 15 mil. Há margem, por esses valores estratosféricos, para você rediscutir a estrutura de cargos e salários", diz. "Em Brasília, por exemplo, há uma distorção grave a ser corrigida quando se observa que o sonho de dez em dez jovens é fazer um concurso público. O jovem quer ingressar numa carreira do Executivo, Judiciário ou Legislativo, independentemente da vocação." 

A estabilidade no cargo, diz a economista-chefe da XP Investimentos Zeina Latif, também seria um ponto a ser discutido. Ela argumenta que, ao ter essa garantia, o profissional deveria começar com um salário mais baixo, para estimulá-lo a se desenvolver. Segundo Latif, uma saída seria adotar valores do setor privado como "meritocracia e concorrência". Essas práticas, diz, já estão presentes em países como Dinamarca, Reino Unido, Suíça e México. "Com o teto, a gente vai precisar discutir prioridades e o incômodo em relação a quão caro é o nosso funcionalismo vai ficar mais explícito. Se a sociedade começa a se incomodar com a estabilidade no setor público quando há tanta gente desempregada, a discussão pode se tornar uma pauta política."

'Nem todos são marajás'

Ao mesmo tempo, Pelatieri pondera que o funcionalismo público federal não é homogêneo e acha que é injusto dizer que toda a máquina é inchada. "Nem todos os funcionários têm tratamento isonômico. Alguns podem ter reajuste mais forte em detrimento de outras categorias. Quem trabalha nos ministérios, na saúde, na educação, não tem o mesmo poder de quem trabalha no Legislativo, no Banco Central, na Receita."
Segundo a pesquisadora, sem espaço para o crescimento da folha de pagamento e com as sanções previstas na PEC, o teto deve levar à redução do número de funcionários públicos, o que poderia afetar ainda mais os hospitais, escolas e universidades do país. "É uma parte do funcionalismo federal a que tem salários muito mais elevados do que nós, reles mortais. Não dá para colocar tudo num saco de marajás."    Fonte: bbc.com/portuguese/brasil-37773416

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