A metragem do terreno, área construída, localização, reformas recentes e preços do entorno são alguns dos itens considerados na hora de definir o valor de imóveis. Todos ligados às características físicas do ativo. Em tese, a cotação dos fundos de investimento imobiliários (FIIs), que são donos de imóveis como lajes corporativas, galpões logísticos e shopping centers, deveria seguir as mesmas variáveis.
A diferença é que, por serem negociados em bolsa, os FIIs estão sujeitos às expectativas do mercado no momento em que as cotas são compradas e vendidas.
E, assim como as ações, o mercado de fundos imobiliários acabou refletindo os temas que prejudicaram o desempenho da bolsa ao longo de 2021, incluindo os ruídos políticos e fiscais que não param de chegar de Brasília.
Cuidado, a Selic vem aí!
Os FIIs também têm um vilão particular que os persegue de tempos em tempos: os ciclos de alta da Selic. Pressionado pela inflação, o Banco Central elevou por sete vezes consecutivas a taxa básica de juros brasileira até chegar a 9,25% ao ano, maior patamar desde 2017.
Mas o que a pressão na curva de juros tem a ver com o desempenho dos fundos imobiliários? A resposta para essa pergunta passa por dois fatores principais.
O primeiro é que alta nos juros aumenta também os retornos dos produtos de renda fixa. O cenário é um prato cheio para alimentar os investimentos mais conservadores.
Na hora de calcular a rentabilidade e os riscos, os FIIs acabam em desvantagem e perdem atratividade. Além disso, os juros salgados encarecem as construções e o crédito, incluindo os financiamentos de longo prazo — menos afetados que os de curto prazo, mas dos quais o setor imobiliário é muito dependente.
Para 2022, o BC já sinalizou mais uma alta de 1,5 ponto percentual na Selic, mas os analistas indicam que o aperto não deve seguir por muito tempo. “Hoje, os mais conservadores falam em fim de ciclo a 10,75%, enquanto os mais agressivos apostam em 12,5% ao ano”, afirma André Freitas, sócio-fundador, CEO e CIO da Hedge Investments.
A queda
Há dois agravantes que acentuam ainda mais a sensibilidade do setor: a popularidade recente — o número de investidores cresceu de forma exponencial nos últimos dois anos — e o alto índice de investidores pessoas físicas nesse mercado (mais de 70%).
Os FIIs têm um grande apelo da isenção de imposto de renda sobre os rendimentos que caem mensalmente na conta. Mas a inexperiência e a tendência para tomar as decisões mais com o coração do que com a calculadora levam o mercado a patamares em que o preço das cotas dos fundos muitas vezes não refletem o valor real de seus ativos.
“Quando temos uma crise, como no último ano, os FIIs de melhor qualidade tendem a se desvalorizar mais, porque, como têm mais liquidez, é onde o investidor consegue sair da bolsa”, explica Rafaela Vitória, economista-chefe do Banco Inter.
O resultado? O IFIX, índice que mede o comportamento dos fundos imobiliários mais negociados na Bolsa, encerrou 2021 com um recuo de 2,29%. Foi o segundo ano seguido de queda do IFIX, que sofreu com o baque com o cenário da saúde em 2021.
A vida depois da queda
A notícia com certeza não agrada quem tem FIIs na carteira e vê as cotas despencando. Agora para quem ainda não havia investido nesse setor ou tem dinheiro em caixa para fazer novas alocações, o cenário catastrófico do ano passado abriu uma série de oportunidades.
Com exceção dos fundos de papel — que investem em títulos de renda fixa relacionados ao mercado imobiliário e podem ser até beneficiados pela Selic crescente — os principais segmentos de fundos imobiliários de tijolos, ou seja, cujo patrimônio está em ativos reais, terminaram o ano com as cotas mais baratas.
Muitos deles estão abaixo até mesmo do custo de reposição, valor necessário para desenvolver novamente os imóveis do portfólio.
Diante disso, a opinião dos especialistas consultados pelo Seu Dinheiro — Rafaela Vitória, do Inter, Rodrigo França, da Devant Asset, André Freitas, da Hedge Investments, e Bruno Nardo, da RBR Asset — é unânime: essa é a hora de aproveitar os pontos de entrada e incluir fundos muito descontados e com bom potencial para dividendos na carteira.
Como identificar as oportunidades
Para isso, primeiro vale relembrar que comprar barato não é sinônimo de bom investimento. Com 391 fundos listados na B3, é preciso separar o joio do trigo na hora de escolher o que entra na sua carteira em 2022.
Segundo Rafaela Vitória, quando falamos de imóveis, seja via FII ou investimento direto, o ponto principal de atenção para os investidores é a qualidade do ativo.
A análise desse elemento passa por fatores que englobam desde a localização e atuação daquele imóvel — ou seja, se será uma sala comercial, um galpão, uma loja, etc — “até se realmente há um mercado para aquele ativo na região”.
Por outro lado, a economista do Inter pede que o investidor evite os fundos pouco diversificados e com baixa liquidez: “nos FIIs monoativos, com um prédio só, por exemplo, há um risco muito grande de que, após eventuais mudanças estruturais, o local fique vago e haja dificuldades para repor o locatário”.
Os FIIs de lajes corporativas e o fantasma do home office
Além das dicas gerais, dentro de cada um dos segmentos de fundos imobiliários há características e comportamentos específicos que também influenciam o desempenho (e a escolha) dos ativos.
Um deles, que concentra as lajes corporativas, vem sofrendo desde 2020 com uma mudança nos ambientes de trabalho acelerada pela pandemia de covid-19. Entre novas ondas e variantes, permanece a incerteza de demanda com a adoção do home office ou o regime híbrido nos escritórios.
Mas, segundo Bruno Nardo, portfolio manager da RBR Asset, essa pulga atrás da orelha não se instalou por todo o Brasil. Ele afirma que, em regiões centrais, como Avenida Paulista e a Faria Lima, em São Paulo, ainda há demanda para bons imóveis.
“Apesar de um momento marginal de vacância, ainda estamos em níveis confortáveis, e bons imóveis corporativos nessas regiões têm tido capacidade até mesmo de aumentar o seu preço de aluguel”, diz Nardo.
Para André Freitas, da Hedge, esse é o segmento que mais se valorizará neste ano. “Embora o trabalho híbrido signifique menor ocupação, a necessidade de atrair os funcionários para o presencial fará com que tenhamos, efetivamente, uma procura para diminuir a densidade nos escritórios e por espaços de descompressão”, justifica.
Mas, afinal, em quais fundos imobiliários investir? Entre as melhores escolhas, os especialistas citam três opções:
CSHG Real Estate (HGRE11) é o escolhido de Rafaela Vitória, do Inter. Ela explica que a vacância do FII hoje é alta para o setor, mas essa é justamente a oportunidade. “Os ativos podem rentabilizar de uma maneira ou outra: alugando os espaços, ou, eventualmente, vendendo-os com ganho de capital”.
JS Real Estate Multigestão (JSRE11) é um dos preferidos de Rodrigo França, da Devant Asset, pela localização estratégica dentro da cidade de São Paulo, bons inquilinos, gestão e liquidez.
Tellus Properties (TEPP11) é o fundo de interesse de Bruno Nardo, da RBR. O gestor aposta no portfólio composto por edifícios nos bairros Bela Vista, Pinheiros, Cidade Monções e Itaim Bibi — todos na cidade de São Paulo.
Os shoppings estão de volta ao jogo
Outro setor penalizado pelas medidas de distanciamento social foi o de shoppings centers. “Eles enfrentam um risco que ninguém tinha colocado na conta até agora, que é o risco de ter de fechar as portas”, resume o gestor da RBR Asset.
A pandemia ainda não foi embora, mas com a campanha de vacinação a todo vapor, a população está de volta aos shoppings e eles estão de volta ao jogo.
“Dependendo do portfólio, temos números até melhores do que os de 2019 nos últimos meses, depois da reabertura total das lojas”, indica Rodrigo França.
Segundo a Associação Brasileira de Lojistas de Shopping (Alshop), as vendas no Natal de 2021 superaram em 10% o mesmo período do ano anterior, mas ainda ficaram 3,5% abaixo do faturamento registrado em 2019.
E romper a barreira do patamar pré-pandemia não é o único desafio dos shoppings neste ano. Parte do mercado acredita que o modelo terá que se provar frente ao e-commerce, um competidor muito forte e que ganhou impulso adicional durante o período de isolamento social.
Para essa batalha, Freitas, da Hedge, acredita que os ativos têm uma carta na manga: “Os shoppings, no Brasil, são equipamentos de lazer em todos os sentidos. Desde os focados na classe mais alta, com restaurantes e serviços específicos, até os voltados às classes mais baixas, que contam com diversão muitas vezes gratuita”.
Se você também acredita na vitória dos shoppings, confira os FIIs favoritos do segmento:
Hedge Brasil Shopping (HGBS11): “É um dos maiores fundos do setor, bem diversificado e com shoppings muito bem localizados nos grandes centros, que tendem a sofrer um pouco menos o impacto de fatores macro como o desemprego e as altas taxas de juros”, comenta Rafaela Vitória.
XP Malls (XPML11): Bruno Nardo, da RBR, exemplifica a importância de ativos bons e bem localizados no setor. “O fundo tem, por exemplo, o Catarina Fashion Outlet, que é um monstro de geração de caixa, no portfólio”, cita.
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